sábado, 6 de março de 2010

A falácia do "...nunca antes na história deste país..."

Quem quer que seja que acompanhe, mesmo que superficialmente, as falas do presimente Lula, principalmente as proferidas nos palanques eleitorais ilegais travestidos de palcos de inauguração até de ordem de serviço, de pedra fundamental e outros eventos mais, sempre ao lado de sua candidata Dilma Roussef, acho que até já decorou a frase aspeada do título acima.
Semana passada, atendendo um paciente amigo em meu consultório, conversamos descontraidamente sobre os rumos da política nacional e a próxima eleição presidencial; o que ouvi desse amigo, a sua convicção ao relatar, mesmo que não tivesse como comprovar, os "mal-feitos" da era FHC e o que de bom aconteceu a partir de 2003, confesso que fiquei impressionado com o poder de convencimento - quase uma lavagem cerebral nacional coletiva - da frase preferida do molusco, desculpem-me, do Lula: "...nunca antes na história desse país..."
Hoje pela manhã, num bate-papo sem compromisso com uns amigos, no beco do cotovelo, ouvi pelo menos uma opinião diametralmente oposta àquela do meu paciente. A diferença é que tudo que eu ouvi hoje foi comentado com bases em dados e números inquestionáveis, divulgados pelo próprio governo, ou pelo IBGE, banco central, FGV, etc.... O avanço e a lucratividade ( para o estado também ) da Mineradora Vale do Rio Doce, depois de privatizada pelo governo FHC, foi um dos exemplos citados, para não deixar dúvida que :"... bem antes (de 2003) na história deste país..." .
Agora, quando estamos cada vez mais próximos da eleição presidencial, o apedeuta Lula " encasquetou" e quer transformá-la em plebiscito; o julgamento/embate seria entre os seus 8 anos de governo e os 8 do FHC. Se alguém no entanto se dispuser a interpretar mais profundamente o que tem acontecido de bom no Brasil, facilmente concluirá que esse plebiscito é de araque, ou seja ( expressão também do gosto da figura )é mais uma falácia de quem nunca soube dos podres ao seu redor ( mais outra mentira ).
Parece que não estamos sós - o amigo do beco e eu - quando interpretamos à luz dos fatos a evolução do país. Prova disso é o artigo do jornalista Ruy Fabiano, postado há 2 semanas no blog do Ricardo Noblat. Para os que não o leram ainda, apresento-o a seguir...


Plebiscito de araque

A estratégia de dar conteúdo plebiscitário à campanha eleitoral, sustentada por Lula e PT, está em contradição com o próprio diagnóstico presidencial a respeito destas eleições.

Há algumas semanas, o presidente sublinhou, como aspecto positivo – e indicador de nossa evolução política –, o fato de não haver candidatos de direita. Todos, na sua ótica, seriam progressistas. E isso seria bom.

Mais de uma vez, elogiou a qualidade de cada candidato. De fato, todos – Dilma, Marina Silva e José Serra - vieram da esquerda.

Só Ciro veio da direita. Foi filiado à Arena, partido de sustentação ao regime militar. Mas já fez seu mea culpa e profissão de fé pública no socialismo, com uma veemência rara. É socialista – e ponto.

Nesses termos, o plebiscito não tem cunho ideológico, na base do direita versus esquerda, mas tão-somente personalista, dentro dos padrões populistas mais ortodoxos.

Lula é o referencial. A eleição seria Lula versus “o outro”. O outro é Fernando Henrique Cardoso.

Nenhum dos dois, porém, é candidato. O embate, em princípio, será entre José Serra e Dilma Roussef, que têm biografias distintas dos seus patronos. Mas o presidente fala claramente nas duas eras: a dele e a de FHC. Povão versus elites.

A era dele, porém, naquilo que apresenta de êxito e substância doutrinária – a política econômica –, decorre da era anterior.

Dá-lhe sequência. Não é casual que, à frente do Banco Central, esteja um ex-tucano, Henrique Meirelles, trazido para a política por Fernando Henrique, que o fez candidatar-se a deputado federal em 2002.

Para sinalizar ao mercado que não mexeria na política econômica – e não mexeu -, trouxe um tucano para o Banco Central. Hoje, Meirelles, filiado ao PMDB, é um dos ícones da Era Lula, que sonha em tê-lo como vice na chapa de Dilma Roussef.

O outro ponto forte da Era Lula é o Bolsa Família, seu principal cabo eleitoral, que, além de lhe render popularidade, serve para demonizar os adversários, acusados de planejar sua extinção.

Ocorre que mesmo essa polarização é artificial e não resiste a um retrospecto. Quem aderiu ao sistema de bolsas foi o governo Lula, que antes o criticava.

Esse sistema chegou ao formato atual inspirado no Bolsa Educação, concebido nos anos 90 pelo então prefeito de Campinas, hoje já falecido, Roberto Magalhães Teixeira, do PSDB.

O então governador do DF, Cristovam Buarque, encantou-se com a idéia e a trouxe a Brasília. Fernando Henrique gostou e a adotou nacionalmente. Lula, ao contrário, repudiou-a.

São palavras dele, em 2000, disponíveis no YouTube: “Lamentavelmente, no Brasil, o voto não é ideológico, e as pessoas lamentavelmente não votam partidariamente. E lamentavelmente você tem uma parte da sociedade que, pelo alto grau de empobrecimento, é conduzida a pensar pelo estômago e não pela cabeça.

É por isso que se distribui tanta cesta básica. É por isso que se distribui tanto tíquete de leite. Porque isso, na verdade, é uma peça de troca, em época de eleição. E assim você despolitiza o processo eleitoral.

Você trata o povo mais pobre da mesma forma que Cabral tratou os índios quando chegou no Brasil, tentando distribuir bijuterias e espelhos para tentar ganhar os índios. Você tem como lógica a política de dominação, que é secular no Brasil.”

O projeto social de Lula, quando assumiu – e está no discurso de posse –, era o Fome Zero, que não deu certo. O Bolsa Família reúne os programas da Rede de Proteção Social, concebido e conduzido por dona Ruth Cardoso, que incluía ainda itens como vale-gás e bolsa-alimentação.

Fundiu-se tudo num rótulo novo e ampliou-se o número de beneficiados, etapa seguinte à implantação da idéia.

Não há, pois, nem mesmo na política assistencialista, o contraste indispensável aos plebiscitos, que é o choque de idéias ou projetos antagônicos.

O que há é a velha luta por cargos entre PSDB e PT, cuja origem é São Paulo, berço de ambos. São os irmãos Karamazov da política brasileira. Não se entendem, mas se parecem.

O tom plebiscitário artificial que se quer impor à campanha serve, como dizia Lula em 2000, para “despolitizar o processo eleitoral” e manter “como lógica a política de dominação”.

A massa, atenta ao Bolsa Família, continuará a “pensar com o estômago”, já que as questões mais relevantes estarão à margem dos debates.

Pior para os debates. Pior para o eleitor.

Nenhum comentário: